dezembro 11, 2004

Livros Científicos Renascentistas em exposição na Biblioteca Nacional
Por ANA MACHADOSábado, 11 de Dezembro de 2004 -Público-

Cerca de centena e meia de obras de referência do conhecimento científico dos séculos XV e XVI estão, até Fevereiro, à vista de quem as quiser admirar na exposição "Conta, peso e medida: a ordem matemática e a descrição física do mundo", na Biblioteca Nacional, em Lisboa. Da primeira edição impressa de "Elementos de Geometria" de Euclides, onde consta o famoso teorema de Pitágoras, passando por Ptolomeu ou Copérnico, mas também pelo "Tratado da Esfera" do matemático português Pedro Nunes, a exposição proporciona um passeio único às teorias que fundamentaram o conhecimento científico ao longo dos tempos.
A abrir a exposição está uma ilustração do teorema de Pitágoras, apresentado numa primeira edição impressa de "Elementos de Geometria", obra quinhentista, de referência para a matemática: "É o livro mais estudado do mundo, a seguir à Bíblia. Já se perderam a conta das edições feitas. Só do século XV e XVI há cerca de 30.
São livros que rondam os milhares de contos, nunca expostos e conhecidos em toda a Europa", conta Henrique Leitão, investigador do Centro de História da Ciência da Universidade de Lisboa e comissário da exposição.
Mais à frente, as obras de Arquímedes mostram outro elemento famoso da matemática que não é estranho a ninguém: o cálculo do pi, numa edição de 1544. São estas as obras que todos os autores do século XVI estudavam, conta Henrique Leitão, passando a outro núcleo da exposição, sobre astronomia, onde se pode admirar "Almagesto", de Ptolomeu, obra de referência histórica, que ainda defendia a teoria geocêntrica. Mais à frente, outra obra de referência: "De revolutionibus", de Nicolau Copérnico, pai da teoria heliocêntrica.
A visita guiada não termina sem uma passagem pelo núcleo de autores portugueses e pelo "Tratado da Esfera" de Pedro Nunes: "É um livro que não tem par. Reconheço que, por paixão, este livro tinha de estar aqui", conta Henrique Leitão, estudioso de Pedro Nunes e responsável pela revisão da obra do matemático português para uma edição de oito volumes, a publicar pela Academia das Ciências de Lisboa e pela Fundação Calouste Gulbenkian.
A mostra conta ainda com livros sobre engenharia e arquitectura, todos com o cálculo matemático e a física como base. Entre eles, ensaios com diagramas móveis, autênticas obras de arte, que ajudavam na elaboração de cálculos, basicamente destinados a mercadores.
O obelisco do Vaticano
Henrique Leitão destaca ainda um livro que, por causa das ilustrações, chama à atenção de todos. Trata-se de um livro de Domenico Fontana que explica, com pormenor, a tarefa hercúlea que foi erguer o obelisco da Praça de São Pedro, na cidade do Vaticano, através de um complexo sistema de dezenas de roldanas puxadas por cavalos.
O comissário da exposição conta que, após a organização da mostra, mais uma vez foi levado a concluir que é injusta a crítica que fazem à cultura científica dos homens portugueses do século XVI: "Ao contrário do que se diz, eram homens altamente informados.
A prova disso é que estas edições de referência da altura estavam todas anotadas", conta, mostrando como certos livros de referência estão totalmente anotados nas margens das páginas expostas. "E só o facto destes livros existirem cá já diz muito sobre a cultura científica portuguesa da altura", acrescenta.
Para o investigador, mais do que uma mostra da cultura científica de referência, esta é uma compilação de obras que mostram a preocupação típica do Renascimento de explicar a natureza: "A mais profunda e central convicção dos homens de ciência dos nossos dias é muito antiga. Foi formulada há milhares de anos. [...] As coisas não habitam no caos ou na indefinição; a realidade tem ordem, está disposta com conta, peso e medida", conta na introdução do catálogo da exposição, que contempla mil obras de referência dos fundos científicos antigos da Biblioteca Nacional, entre as quais as 140 agora em exposição.
Esta é também a primeira vez que todas estas obras são catalogadas, um trabalho importante para que investigadores e estudantes de todo o mundo possam ter acesso às obras que estão na Biblioteca Nacional e para que o património da instituição esteja devidamente referenciado: "É a única oportunidade de ver o valor da instituição nesta área."
O trabalho de investigação que culminou na exposição trouxe ainda a oportunidade de restaurar algumas das obras. Alguns livros, de elevado valor patrimonial, tinham já a marca do tempo e precisavam de uma intervenção para que não se perdessem: "Conseguimos restaurar cerca de 15", adianta Henrique Leitão.
Esta exposição da Biblioteca Nacional é a primeira iniciativa nacional feita no âmbito do Ano Internacional da Física, que se comemora em 2005. A mostra, de entrada livre, está patente ao público até ao dia 28 de Fevereiro, todos os dias úteis entre as 10h00 e as 19h00 e aos sábados entre as 10h00 e as 17h00.

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